A volta da reeleição do presidente da Assembleia e a disputa pela prefeitura de Campo Formoso
“Será assim de norte a sul
A terra nua, semelhante à lua
O que será desse planeta azul?”
(Planeta Azul, de Xororó e Aldemir)
Começou a tramitar na Assembleia Legislativa da Bahia a proposta de emenda à Constituição (PEC) que restabelece a reeleição para a presidência da Casa, mas apenas uma vez – antes, não havia essa limitação, tanto que o ex-deputado Marcelo Nilo foi reeleito três vezes e ficou oito anos no comando do Legislativo baiano.
O fim do instituto da reeleição do presidente e dos demais membros da Mesa Diretora foi aprovado em abril de 2017 por meio de uma PEC apresentada pelo deputado Adolfo Menezes (PSD) e que teve como coautor o deputado Rosemberg Pinto (PT).
Não por coincidência, a apresentação da nova PEC – já encaminhada à apreciação da Comissão de Constituição e Justiça, conforme publicado na edição desta quinta-feira, 23, do Diário Oficial do Legislativo – é também o primeiro passo oficial no processo que visa a reeleição do mesmo deputado Adolfo Menezes, hoje aboletado na presidência da Casa.
Menezes, que está no quinto mandato de deputado estadual e foi também vereador e prefeito de Campo Formoso, segue o modelo das velhas raposas políticas: não fala sobre o assunto e alega que a eleição está distante. De fato, o movimento que abre as portas para sua reeleição, começou com mais de um ano de antecedência – a eleição da próxima mesa diretora da Assembleia está marcada para o primeiro dia de fevereiro de 2025, conforme determina a Constituição Estadual.
A PEC que restabelece a reeleição foi subscrita por nada menos que 47 dos 63 deputados estaduais da Bahia (agora, sim, por coincidência: o mesmo número de parlamentares que, em 2017, votaram pelo fim da reeleição).
Isso significa que, em tese, três em cada quatro deputados, independentemente dos partidos a que estão filiados, estão abertos à possibilidade de apoiar a reeleição do atual presidente. É óbvio: quem não concorda não assinou a PEC. Foi o caso, por exemplo, do líder do governo, deputado Rosemberg Pinto (PT), e da deputada Ivana Bastos (PSD), que têm uma motivação maior para se opor, não ao princípio da reeleição, mas à recondução do atual presidente: é que ambos sonham sentar-se na cadeira presidencial.
Dentre os outros 14 deputados que não colocaram o jamegão na PEC da reeleição, quatro têm motivação mais paroquial: são ligados ao deputado Elmar Nascimento, líder do União Brasil na Câmara dos Deputados e ferrenho adversário de Adolfo na terra natal de ambos: Campo Formoso, no norte do Estado, a 410 quilômetros da capital.
Lá, na última disputa municipal, Elmo Nascimento, irmão de Elmar, derrotou a prefeita Rose Menezes, irmã de Adolfo, que disputava a reeleição. No próximo ano, tudo indica, esses dois se enfrentarão novamente, mas dessa vez com Rose apoiada por um Adolfo politicamente mais fortalecido, pois sentado na cadeira de presidente da Assembleia e com mais dois anos no poderoso cargo praticamente garantidos.
E aqui mais uma coincidência: na mesma semana em que se concluía o recolhimento de assinaturas de apoio à PEC da Reeleição, a imprensa nacional noticiou as conclusões de um estudo desenvolvido pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e pelo Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) que identifica, pela primeira vez, características de clima árido no Norte da Bahia. Um processo de desertificação que atinge também parte do município de Campo Formoso, cujo comando político é disputado pelos grupos de Adolfo e Elmar.
Lá, onde a área de desertificação já chega a 80 km², permaneciam guardadas, até o mês passado, em um terreno da prefeitura, cerca de duas centenas de reservatórios de água com capacidade de 10 mil litros cada, à espera de distribuição com as famílias locais que vivem em situação de insegurança hídrica.
Os reservatórios foram doados pela Codevasf, estatal federal incluída na área de influência do deputado Elmar Nascimento, que apadrinhou a indicação de seu diretor-presidente, Marcelo Moreira. Por conta disso, só no ano passado, Campo Formoso recebeu do governo federal 500 tanques de água de 10 mil litros, 400 caixas de 1 mil litros e 400 caixas de 500 litros.
As caixas d’água são o reforço de Elmar para a campanha de reeleição de Elmo, o irmão prefeito de Campo Formoso. É com esse trunfo que ele pensa superar a ascensão do rival à presidência da Assembleia e manter o mano sentado na cadeira de prefeito por mais quatro anos. Já Adolfo atua discretamente por sua própria reeleição, para dobrar o cacife e reconquistar a prefeitura para a irmã. A conferir.
José Carlos Teixeira zecarlosteixeira@uol.com.br é jornalista, graduado em comunicação social pela Universidade Federal da Bahia e pós-graduado em marketing político, mídia, comportamento eleitoral e opinião pública pela UniversidadeCatólica do Salvador
Opiniões e conceitos expressos nos artigos são de responsabilidade do autor