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Edson Miranda


Teatralidade à brasileira: o povo sempre se ferra



Neste texto, pretendo levantar algumas observações, surgidas para mim, a partir dos debates, sobre a atual reforma da Previdência, entre o ministro da Economia, Paulo Guedes, senadores da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado e deputados da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania da Câmara.


Antes de adentrar ao pragmatismo da disputa política, algumas considerações sobre o projeto de reforma da Previdência.


O atual modelo, pensado a partir da solidariedade entre gerações de seres humanos, precisa ser aperfeiçoado, pois, pela nova natureza do regime de emprego no Capitalismo e, particularmente, por ações egoístas de “tribos humanas” mais poderosas, tornou-se um sistema injusto, promotor de iniquidades que só fazem se avolumar com o tempo.


Na verdade, o sistema atual, não o modelo, caminha a passos largos no rumo da degeneração. Perde assim, a essência civilizatória embutida no ideal de solidariedade e, com isso, seu viés mais belo: o sentimento humano de com (paixão).


Mesmo com boa-fé para aperfeiçoar o modelo, a partir dos problemas levantados, temos que ter boas estratégias para se mexer nesse tipo de “ordem imaginada”. Pois, ela se encontra simbolicamente enraizada na alma da Nação e os seus reflexos positivos, em boa parte do corpo nacional, são, até aqui, bastante considerados.


No caso em tela, acredito, ser necessário se acenar para a população com mudanças em outros sistemas, que são conexos ao sistema previdenciário. Também oferecer Garantias, essas necessariamente chanceladas pelo Estado e pela Política, já que as ações de mudança se projetam nas incertezas do tempo futuro.


Tudo o que o atual sistema político estatal, desmoralizado e em convulsão, não pode garantir.


Percebo que, apenas o envio do projeto do Ministério da Justiça de combate ao crime organizado, à violência e ao crime de corrupção do colarinho branco, enviado paralelo ao projeto da Previdência, não será capaz de gerar essa fundamental liga de Garantias e de Confiança.


Mais ainda, o fato agravante do projeto da Justiça enfrentar grandes resistências, por parte dos políticos de plantão, muitos atolados até o pescoço com crimes das três ordens elencadas, funciona como uma trava potente, talvez a mais potente de todas, a qualquer possibilidade de se abrir um ciclo de repactuação da vida nacional, de uma concertação política e social à brasileira.


 


“Gato escaldado tem medo de água fria”, natural que exista por parte da população em geral uma desconfiança, uma descrença, uma desesperança, que, depois de reformarem à Previdência, depois do sacrifício dos de baixo, tudo se acomode num novo pacto de convivência dos de cima, algo recorrente na história do Brasil.


Por sinal, para quem sabe ler Signos, não os do Zodíaco, nada contra, mas os que se apresentam para nós, em profusão, na vida cotidiana e na política, podemos recolher indícios vários de que a mesa continuará com as pernas fixadas no solo.


Um simples exemplo só para ilustrar: a alíquota de 22% para os salários que excedem o “Teto”, antes das demais significações, carrega o significado maior de que a lei é o que menos vale no Brasil. Ou só vale para alguns. Já que o extra teto é uma ilegalidade. Sobrevive graças a malandragens interpretativas.


Na minha modesta compreensão, um índice claro de que o combate a privilégios, apontado pelos que defendem o atual projeto, pode ser algo para inglês ver.


Esse e mais um conjunto de sinais, a exemplo das medidas relativas ao BPC, o lobby político das Corporation, também de corporações profissionais poderosas e a transição para um sistema de Capitalização, onde a participação pecuniária do Estado e do Capital Privado, na composição do sistema, poderia ser decidido mais na frente, avolumam ainda mais a desconfiança.


Intuitivamente ou explicitamente, o povo já desconfia de que o atual sistema político-estatal, eivado de promiscuidades, não tem a mínima condição de ser o fiador de mudanças tão significativas.


Poucos brasileiros, hoje em dia, acreditam na capacidade do atual sistema político, nele incluso a ordem jurídica atual, em rever, a tempo, injustiças flagrantes que se agudizem futuramente.


Na cabeça de boa parte dos brasileiros, já vivemos uma situação de pré anomia. Basta olhar para o quadro de “salve-se quem puder” ou de “primeiro o meu”, pendurado na sala de visitas dos que habitam o andar de cima da pirâmide social.


Todos esses elementos, nos faz acreditar que no cerne do que está sendo proposto como mudança positiva, exista uma acomodação material e intelectual com a situação de miserabilidade em que vive a maioria do nosso povo.


Essa insensibilidade se expressa na tentativa de estender a miséria ad aeternum, tendo como justificativa principal o argumento de que, no presente, a situação de precariedade já é igual ou até pior do que aquela que se antever para o futuro.


Uma espécie de “jogar a toalha” na luta contra essa enfermidade histórica.


Uma resignação, uma aceitação da miséria humana como algo natural!


Diante desse quadro, só falta algum engraçadinho resgatar o velho jargão delfiniano de que  “é preciso deixar o bolo crescer para depois dividi-lo”.


Nesse sentido, a situação está tão séria que o novo establishment trata a questão com “um pé atrás”. Ele parece não acreditar que a atual política consiga cumprir o seu objetivo de oferecer saídas criativas e pacíficas para os conflitos.


Assim, aposta-se também algumas fichas na Guerra!


Como precaução, já tratam de arregimentar ou cooptar os senhores das armas. A reestruturação da carreira militar, beneficiando principalmente o generalato, a meu ver, pode cumprir esse papel de tentar atrair os militares para “o lado certo”, num momento em que se suplica o sacrifício de todos.


Pode funcionar também como vacina para se evitar aqui o fenômeno ocorrido na Venezuela, onde Chaves atraiu as Forças Armadas para “um projeto de esquerda”.


Lula até que tentou, se algum general tivesse carregado aquele isopor, recheado de latinhas de cerveja, na Base Naval de Inema, talvez a situação hoje fosse outra.


Essa foi só para descontrair, já que o riso não pode escapar ao Teatro Circense.


Por fim, aproveito a piada para mostrar o papel da dita esquerda nesse debate com Guedes.


Totalmente perdida! Uma lástima!


Homens e mulheres com mais de 40 anos de formação política, com experiências de gestão de governos, incapazes de um debate consistente.


Apostam, mais uma vez, no caos, na desinformação, no famoso “ganhar no grito”.


Na estratégia de incitar, tornar o “inimigo” nervoso, irracional, visando, exclusivamente, a propaganda nas redes no dia seguinte.


É o método Thuthuca!!!


Tudo indica que todas as apostas da “esquerda” continuam sendo feitas, erradamente, faço questão de afirmar, apenas no cálculo eleitoral.


O que se apresenta, até agora, são malabarismos discursivos da dita esquerda, muitos recheados de meros ideologismos, com inconsistências de realidade, dados, números, e alguns desses malabarismos até ancorados em fakes.


Perderam uma grande oportunidade de apontar questões de ordem técnica, política, cultural e existencial que são cruciais para a construção da Nação Brasileira, com a qual, um projeto consequente e responsável de Esquerda, deva estar completamente implicado.


Paulo Guedes, sozinho, sem tanta experiência política, um “quase neófito” na política, deu de goleada nos senadores e nos deputados da “esquerda”.


Vergonhoso! Continuam apostando no mero “sou contra” e na queima de pneus. Não percebem que as margens para esse tipo de manobras, a cada dia diminuem mais.


O número dos incautos que ainda se deixam engabelar por essa retórica rebaixada também decresce substancialmente dia após dia.


Conscientemente, articulam um jogral pantomímico perante as câmeras de transmissão dos debates. Vocalizam e expressam apenas “dispositivos de controle” para uma “massa” cuja maior vocação, hoje em dia, é se libertar de tais amarras.


Ainda presos no passado, sem conseguir perceber a complexidade presente, exprimem apenas fantasmagorias.


Lideranças outrora importantes, parlamentares, governadores, ex-governadores, líderes sindicais e sociais, se arrastam como fantasmas nas entranhas de Brasília, ora torcendo, ora conspirando, para que instituições não sejam aperfeiçoadas, atualizadas, reprogramadas à luz da contemporaneidade.


Perderam o bonde da História! Se acovardaram no momento em que mais a Nação clamava por mudanças substanciais. Encarceraram a verdadeira liderança que é o nosso povo.


O pior de tudo: organizam convescotes, com os ratos de sempre, para que investigações não avancem, para que castelos de areia não venham a baixo!


Com isso, se tornaram partidos da reação, fiadores de uma democracia de fachadas, de uma república de mentiras.


Mentem ao afirmar que o conflito com as instituições tradicionais não interessa ao povo.


Como não interessa, se o conflito é a essência da Democracia.


Os interesses populares emergem, aparecem, muitas vezes, nos conflitos intra e inter institucionais. Assim também, adquirem condições de mediação pela Política e pelas Instituições da Democracia e da República. São essas que, quando verdadeiramente independentes, devem dar curso pacífico e efetivo a tais interesses em conflito.


Negar o conflito é negar a natureza do regime democrático.


Se negar a levar avante, no Senado da República, um debate, consubstanciado em fatos determinados, sobre um impeachment de um juiz da suprema corte, com o falso argumento de que isso possa levar a um conflito, é apostar numa democracia de faz de contas. Numa política de alcovas.


Dessa maneira, trabalham para alimentar a cultura dos velhos e surrados conchavos e, consequentemente, a cultura política do Golpismo.


Correr do conflito como o diabo corre da cruz, como atualmente protagonizam os carcomidos partidos políticos, dentre esses os ditos de esquerda, significa que o que está em jogo são apenas os interesses inconfessáveis das elites.


Apanhados nos vícios dos partidos tradicionais brasileiros – os da direita conservadora, liberal ou social-democrata, e ainda no pior deles: a corrupção – os partidos ditos de esquerda, sem coragem crítica suficiente para se libertarem desse verdadeiro “abraço de afogados”, optam, também, pelo pior dos mundos para o povo brasileiro e seus trabalhadores: “a paz dos cemitérios”.


Derivações desse pensamento, incrustado em organizações como a CUT, a OAB et caterva, agora se arvoram em manifestações para “salvaguardar” o STF.


Não são só os “loucos” que ameaçam o STF. Mas, também, o STF que, ao se transformar nessa máquina de produzir loucuras, ameaça os “potencialmente loucos”, e olha que não são poucos.


A OAB contribuiria mais com o Brasil, nesse momento, se, se impregnasse de coragem para averiguar o possível envolvimento das grandes bancas de advogacia brasileiras com esse lamaçal de corrupção.


Acho que era Gabriel Garcia Marques quem afirmava em relação à América Latina: “somos uma civilização de loucos. Ainda fazemos alguma coisa por causa dessa condição”.


Quem é capaz de afirmar, se dessa experiência de loucura que, atualmente, vivenciamos, não encontraremos a saída para a sanidade e para sua real valorização?


O que sei é que as instituições brasileiras devem amadurecer, urgentemente, para o ideal Democrático, inclusive de uma Democracia mais substantiva, de baixo consenso e de crescimento vertiginoso de novos sujeitos, e isso só acontecerá com uma salutar reestruturação e uma melhor distribuição do Poder.


É fácil olhar para a atual estrutura do STF, por exemplo, e perceber o que está em jogo. Perceber que o que está em jogo é o “Majestoso Poder” que o STF exerce sobre a vida brasileira.


Os ministros se mantêm ali até os 75 anos, caminhando com o auxílio da bengala, não é pelo salário para manter suas famílias. A maioria deles, caso queira, já estaria aposentada com o salário integral e com paridade entre ativos e inativos.


O que os mantêm trabalhando é exatamente o “Majestoso Poder” e toda a capacidade, que está investida no seu exercício, para se autobeneficiar e também beneficiar segmentos poderosos na estrutura social, econômica e política brasileira, com exceções evidentemente.


É esse o jogo historicamente jogado.


Garanto que, caso o Congresso aprove uma Emenda Constitucional da maca e do banguê (PEC do Banguê, seria justíssimo, só em pensar na imagens, já tenho frouxos de risos) suas excelências continuariam “trabalhando” aos 85, 90 anos, fazendo uso desses “meios de acessibilidade”.


Se alguém ainda tiver dúvidas quanto a isso, eu serei forçado a dizer: é o PODER estúpido!


É Isso, forte abraço.


Edson Miranda mbedson@gmail.com é jornalista, professor universitário e escreve no blog do Miranda


Opiniões e conceitos expressos nos artigos são de responsabilidade do autor


 
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