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Edson Miranda


A inutilidade do voto



O atual sistema político brasileiro torna irrelevante o desejo que a maioria do eleitor tem de promover mudanças no país e, consequentemente, na sua vida precária e miserável.


O povo é chamado, mais uma vez, como o faz de quatro em quatro anos, para escolher seus carrascos, chancelar as instalações do seu próprio matadouro e para se iludir achando que vai ser convidado, algum dia, para um banquete.


O sistema político eleitoral está se lixando para “ o país que eu quero é um país…”.


A voz do povo só é escutada para orientar a direção da manipulação das suas emoções e para instruir os cruéis contendores.


A impostura e o esconde esconde são suas características principais.


A malandragem do jogo consiste em ser o mais dissimulado.


A verdade, a meia verdade, um desejo ou um sentimento, expresso de maneira amadora, viraram fatais no tabuleiro eleitoral.


A ingenuidade atrapalha. Somente o vício pode conduzir ao podium.


O voto deve ser dado da maneira mais cega possível.


As propostas, principalmente, econômicas devem ser expostas de maneira genérica, sem nenhum estudo de impacto, viabilidade, a partir de números e estatísticas concretas.


Nada pode ser dito para contrariar a narrativa. Narrativa é tudo, proposta não é nada.


Do ponto de vista econômico, os eleitores de Bolsonaro estão votando num liberal ou num nacionalista?


E os petistas, qual garantia têm de que Haddad não chamará Meirelles?


Quem souber morre!


“Cala boca, Mourão”, esbraveja o capitão caverna, com receio de que se ofereça indícios do processo violento para colocar o Brasil definitivamente na rota da superexploração neoliberal e na perda desumana de direitos, diga-se, já em andamento.


“Cala boca, Dirceu”, vocifera o boneco de ventríloquo, com medo de que descubram a tentativa de construção de um poder oligarca por trás do discurso “socialista”.


No caso de Dirceu, que não é nenhum neófito na política, acredito que esse discurso serve para acalentar a militância.


Assim como, o discurso de indultar Lula vai ao encontro do pragmatismo do eleitor lulista: o povo só vai acreditar que “vai ser feliz de novo” se for pelas mãos de “padin” e não de terceiros. Se “padin” vai ficar preso, a profecia não vai se realizar, logo, a transferência dos votos não vai ocorrer a contento.


Sem compreender ainda a natureza do ambiente para o qual estamos sendo jogados, preferimos nos comportar feito baratas tontas, destruindo nas redes e nas ruas o pouco de vínculo solidário que ainda nos resta.


Este vínculo, por sinal, tão eficaz em todo o trajeto antropológico, continua como o único mecanismo, nesses brutos tempos atuais, capaz de nos livrar das tragédias instaladas.


Enxergando apenas a árvore e cegos à floresta, matamos e morremos em guerras que não são nossas.


Precisamos “guerrear” sim, mas, para reconfigurar o sistema político, para construir um novo pacto, justo e digno, de convivência.


Esse atual sistema de representação, com essa forma arcaica partido e políticos, é a causa principal do fracasso e da opressão da maioria da população brasileira.


Antes que algum engraçado argumente que pelejo contra a Democracia. Que prego em viés autoritário. Digo que não é verdade. Ainda precisamos de partidos, mas, eles precisam ser testados num ambiente de Democracia Substantiva.


Com esses políticos de araque, sequer conseguiremos implementar a República no nosso país. E olha que já somos instados a nos defender de problemas e agendas que nem de longe passam pelo leque de suas preocupações: a exemplo das novas tecnologias disruptivas que ameaçam colocar sem empregos e na mais assombrosa irrelevância centenas de milhões de seres humanos no Brasil e no planeta.


Uma mudança consequente só virá dessa nossa capacidade de tecer novas formas de organização e de luta, a partir desse vínculo solidário construído ao longo do processo civilizatório.


A esquerda brasileira traiu todos os nossos sonhos. A radicalização com o sistema histórico de privilégios e de opressão não aconteceu. Uma nova oligarquia se formou e se rendeu ao eterno jogo bruto com os de baixo, ao luxo e às benesses proporcionadas pelo sistema perverso.


A situação é tão grave que a direita conseguiu roubar esse discurso, arrasta amplas massas, frustradas com a traição e com a permanência dos privilégios, e agora finge para o distinto público que vai destruir o sistema histórico de iniquidades.


Sem discurso, sem uma nova narrativa consistente, sem lugar de fala e com telhado de vidro, principalmente por causa da corrupção, antes restrita às elites históricas, os atuais partidos de “esquerda” podem até ganhar essas eleições, mas, perderam a capacidade de se contraporem ao novo jogo de forças do neoliberalismo no Brasil.


Desesperada, só resta à “esquerda” atacar com as mesmas armas da direita: a instalação do medo e do pânico. Esquecendo que o pânico é apenas mais uma forma de prepotência. Uma pretensão de quem acha que tem a verdade e sabe, no nosso caso, em qual buraco o Brasil está se metendo.


Esquece que o fascismo, assim como o câncer, é um germe que já vem inoculado no ser humano, consequentemente nas suas organizações, bastando para se desenvolver de tempo de exposição, interações adversas e condições adequadas de temperatura e pressão.


Quem em sã consciência apostaria que o pensamento liberal algum dia, escancaradamente, abriria mão da sua pregação teórica para na prática suprimir liberdades, inclusive a econômica.


É sinal de que vivemos os estertores da última grande metanarrativa criada pela Modernidade e nos encontramos novamente num marco zero.


O fantasma de um inadvertido Romantismo volta a fazer círculos por nossas cabeças.


É hora de, com coragem, enterrar cadáveres.


A História, felizmente não acabou!


Edson Miranda mbedson@gmail.com é jornalista, professor universitário e escreve no blog do Miranda


 
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