Policlínica Regional de Camaçari: Desrespeito e Politicagem
No mês de março deste ano, a Secretaria de Saúde do Estado da Bahia anunciou que a Bahia foi contemplada com 3 policlínicas regionais, uma delas em Camaçari, como parte das ações do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), e nos últimos dias, informou que abriu a licitação para a sua construção. Contudo, essa decisão levanta diversas críticas e preocupações sobre a política de regionalização da saúde e a falta de diálogo com os municípios envolvidos.
A política de regionalização da saúde visa à descentralização dos serviços, promovendo uma gestão compartilhada e mais próxima das necessidades locais. No entanto, a aprovação da Policlínica Regional de Camaçari foi realizada sem interlocução com os municípios da microrregião de saúde. Esta falta de diálogo não apenas desrespeita os princípios do SUS, como a sua governança colaborativa, mas também mina a eficácia da regionalização da saúde ao ignorar as especificidades e demandas de cada município.
A Comissão Intergestora Regional (CIR) da Microrregião de Saúde de Camaçari, da qual sou o atual Coordenador Adjunto, é formada pelos secretários de saúde dos municípios de Camaçari, Mata de São João, Dias D`Ávila, Simões Filho, Pojuca e Conde, além de representantes da Secretaria Estadual de Saúde, do Núcleo Regional de Saúde da Região Leste, e conta com a participação do COSEMS-BA (Conselho Estadual dos Secretários Municipais de Saúde do Estado da Bahia).
Ao tomar conhecimento da Policlínica Regional de Camaçari, a CIR solicitou esclarecimentos à Secretaria de Saúde do Estado, entretanto, até a presente data, não recebeu resposta. Esta falta de comunicação e transparência evidencia um desprezo pela política de regionalização da saúde, que deveria primar pelo diálogo e pela gestão compartilhada.
Um dos pontos críticos é a ausência de clareza sobre a gestão da nova policlínica. Questões fundamentais como quem será responsável pela gestão e qual será o modelo adotado permanecem sem resposta. A indefinição sobre esses aspectos gera incerteza e preocupação quanto à eficiência e sustentabilidade da policlínica. Será a gestão direta do estado, municipal ou uma parceria público-privada? Essas perguntas são fundamentais para entender como a policlínica funcionará na prática.
A decisão da Secretaria de Saúde da Bahia, sem discursão com os municípios e sem informações claras, leva a outras perguntas, igualmente sem respostas. Quais serviços e especialidades serão oferecidos pela nova policlínica e como serão distribuídos entre os municípios da região? A definição dos serviços é essencial para garantir que as necessidades de saúde da população sejam atendidas de maneira adequada e que não haja duplicação ou lacunas na oferta de serviços.
Outro aspecto negligenciado é o impacto dessa nova policlínica no Consórcio Público Inter federativo de Saúde da Região do Metro Recôncavo Norte (MRN), formado pelos municípios integrantes da CIR de Camaçari e mais o município de Lauro de Freitas, que possui a Policlínica Regional de Simões Filho. Como a nova unidade em Camaçari afetará a dinâmica desse consórcio? Sua policlínica será desativada? Haverá sobreposição de serviços ou uma redistribuição das funções? Qual o impacto orçamentário nos municípios e no próprio consórcio? Estas são questões que deveriam ter sido abordadas previamente, em conjunto com os municípios envolvidos.
Além disso, a presidente do consórcio e seus membros desconheciam o pleito da Secretaria de Saúde do Estado da Bahia (SESAB) para a aprovação da proposta de construção da policlínica. A falta de comunicação da SESAB e o desconhecimento dos próprios membros do consórcio sobre um projeto de tamanha relevância evidenciam uma grave falha de governança e transparência. Isso reforça a necessidade de um diálogo aberto e transparente entre todos os atores envolvidos na gestão da saúde da microrregião. A falta de transparência nesse aspecto impede uma avaliação precisa do benefício real da nova policlínica para a região.
Permanecem incerto e sem respostas, se haverá uma contrapartida municipal para o investimento e o custeio da nova policlínica. A definição de contrapartida tem que ser planejada para assegurar a viabilidade financeira do projeto e o comprometimento dos municípios com a iniciativa. Sem essas informações, é difícil avaliar a sustentabilidade econômica da policlínica e o impacto que ela terá nas finanças dos municípios envolvidos.
Outro ponto que merece destaque é o fato de que o anúncio da construção da policlínica foi realizado em um ano com eleições municipais, através de pré-candidatos a prefeito e vereadores do partido do governo do estado. Esse contexto eleitoral levanta suspeitas sobre o uso político do projeto, questionando a real motivação por trás do anúncio. A instrumentalização de obras públicas para fins eleitorais compromete a seriedade das políticas públicas e pode desviar o foco das necessidades reais da população.
A Policlínica Regional de Camaçari, sem uma interlocução adequada com os municípios da microrregião de saúde e em período eleitoral, levanta sérias preocupações sobre a política de regionalização da saúde na Bahia. A falta de clareza sobre a gestão, os serviços oferecidos, a distribuição entre os municípios, a contrapartida municipal, e o desconhecimento dos membros do consórcio gera incertezas que podem comprometer a eficácia e a sustentabilidade do projeto. É imperativo que a Secretaria de Saúde do Estado da Bahia promova um diálogo aberto e transparente com todos os municípios envolvidos para garantir que a nova policlínica atenda verdadeiramente às necessidades da população e contribua para o fortalecimento da saúde regional.
Luiz Duplat duplat.luiz@hotmail.com é médico obstetra, especialista em saúde da família e secretário de saúde de Camaçari
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08/07/2024