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Waldeck Ornélas é especialista em planejamento urbano-regional

O nome da praça é Cairu


Nada contra homenagear Maria Felipa. Mas, definitivamente, o lugar está errado


Em 1968, ainda estudante, cursava Direito à noite, na UFBA, e trabalhava, durante o dia, como oficial de gabinete, na então Secretaria de Viação e Obras Públicas da Prefeitura Municipal de Salvador, condição que me permitiu, com muita honra, ser designado para secretariar uma comissão de notáveis intelectuais, destinada a “restabelecer os nomes tradicionais e populares dos logradouros da cidade”.


Integravam esta Comissão os senhores Monsenhor Manoel de Aquino Barboza, pároco da Conceição da Praia, e Albano Frederico Marinho de Oliveira, como representantes do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia (IGHB), Luiz Menezes Monteiro da Costa, representante da Academia de Letras da Bahia (ALB), Godofredo de Figueiredo Filho, diretor regional do então Departamento de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, atual IPHAN, Affonso Ruy de Souza, diretor da Divisão de Cultura e Arquivo da Secretaria Municipal de Educação e Cultura, Flávio Costa, titular da então Superintendência de Turismo de Salvador – Sutursa, Adroaldo Ribeiro Costa e Jorge Calmon, sob a presidência do secretário de Viação e Obras Públicas da Prefeitura Municipal, Eng. Luís Lessa Ribeiro. Era prefeito Antonio Carlos Magalhães.


Zelosamente, subdistrito a subdistrito da Cidade Antiga, a Comissão passou em revista e discutiu, rua a rua, os nomes oficiais vis-à-vis os nomes populares, validando os que deveriam ser adotados em definitivo, corrigindo as distorções criadas. Com isto, valorizou-se a expressão popular e tradicional do povo de Salvador.


Qual não é a surpresa quando vemos agora, não mais que de repente, o nome da Praça Cairu – portal da Cidade Baixa – ser alterado para Praça Maria Felipa. Nada contra homenagear Maria Felipa. Mas, definitivamente, o lugar está errado. Até em relação à sequência histórica, a Abertura dos Portos é anterior à Independência.


A praça Cairu é um dos ícones e principais referências da capital da Bahia, tendo sido recentemente beneficiada por inúmeros investimentos públicos que a transformaram em um importante centro cultural. Coincidentemente, o próprio Arquivo Público, cujo diretor integrou a referida Comissão, que então funcionava no antigo Seminário de São Dâmaso, na rua do Bispo, acaba de ganhar imponente sede e modernas instalações exatamente na Praça Cairu, junto à Casa das Histórias de Salvador. Que esta mudança de nome se torne, apenas, mais uma das estórias da cidade...


Grave é que não se trata de fato isolado, mas de estratégia urdida por correntes ideológicas que querem apagar a História, em uma sociedade como a nossa, que já não prima por cultuar os seus fatos e heróis.


Não é, tampouco, algo novo. Derivada da Constituição de 1988, a proibição de nomes de pessoas vivas em logradouros e equipamentos públicos vem impedindo o registro histórico do presente. Antes, ao chegarmos em uma cidade, os nomes das ruas, praças, escolas, postos de saúde e similares contavam a história do município, diziam da época em que foram abertos ou beneficiados. Hoje isto não pode mais ocorrer.


Momento houve em que os nomes dos presidentes do regime militar foram varridos de logradouros e equipamentos, como se o período não houvesse existido. Agora, começa-se a substituir ao acaso (em espanhol se diz “al hazar” – e talvez fosse mais apropriado), sem qualquer critério, nomes do passado, para pôr em relevo outros personagens ou eventos, sempre com uma mesma conotação político-ideológica.


As instituições – no caso, as câmaras de vereadores e prefeituras – não podem coonestar esta orientação, que busca, em última instância, reescrever a História. Narrativas têm se tornado, muitas vezes, mais importantes do que os fatos reais, verdadeiras fake news.


Fiel a meu mandato de secretário da ilustre e histórica Comissão, guardo o preceito de que deve prevalecer, em cada logradouro da cidade, o nome tradicional e popular, aquele que o povo usa. O nome da praça é Cairu!


Waldeck Ornélas waldeck.vo@gmail.com é especialista em planejamento urbano-regional. Autor de “Cidades e Municípios: gestão e planejamento”. Foi senador, ministro da Previdência e secretário de planejamento do estado


Opiniões e conceitos expressos nos artigos são de responsabilidade do autor

26/03/2024

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