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Luiz Roberto Sobral


A praça e a pressa



O ciclo de festas populares da orla de Camaçari, realizadas em louvor e agradecimento aos padroeiros religiosos de cada localidade pelas conquistas e bênçãos do ano anterior, foi encerrado em Jauá, antecedendo a tradicional Lavagem de Arembepe, a ser realizada em março próximo. Tais festividades tiveram uma característica em comum nestes últimos anos, primando pela pouca participação e vibração do público, em que pesem os altos investimentos da Prefeitura em infraestrutura para realização dos cortejos, montagem de palcos sonorizados e a contratação de atrações artísticas.


Na festa de Jauá entretanto, além dos discursos vazios e descabidos de sempre, que mesclam demagogia oportunista com fervor religioso, o alcaide municipal revelou uma surpresa aos presentes, anunciada entre a queima de fogos e a cortina de fumaça que se formou em volta da praça da igreja, cenário digno de algo nada surpreendente e inovador! Parecendo mágico sem cartola distante do seu picadeiro, falando pouco audível e apressado, sua excelência tirou de dentro do seu bonezinho uma carta de pouco valor, dentre tantas outras distribuídas em Camaçari: a Construção e Requalificação da Praça e Lagoa de Jauá! Nem na terminologia correta acertou o alvo; a praça já está construída desde os anos 2000 e a pretensa obra não trata de requalificação urbana, pois não envolve reestruturação do ambiente físico e o envolvimento da comunidade residente e usuária.


A placa colorida fincada após o anúncio ilustra uma reforma na praça e a ampliação do estacionamento da lagoa, onde será agregada uma quadra de esportes, pista de skate e quiosques de apoio aos usuários, além do que lá existe feito por outros gestores. A pressa em apresentar algum benefício à Jauá e seu eleitorado, seja nativo ou visitante, desconsiderou totalmente a possibilidade de apresentação e discussão prévia da intervenção, prática essa autoritária e usual ao longo da gestão municipal que até agora, três anos e dois meses do seu começo, sequer deu posse ao Conselho da Cidade ou mesmo ao de Meio Ambiente.


Descaso inadmissível e ausência de atenção do governo para com a exuberante paisagem natural mais repleta de ecossistemas da faixa litorânea da RMS, além de local preferencial dos residentes na cidade de Camaçari e arredores, Jauá já faz por merecer intervenções estruturantes, de peso e definitivas, as quais, a título de alerta e premência na sua consecução, estão apontadas a seguir.


Saneamento Ambiental da Lagoa – Com alto grau de despejos de esgotos domésticos provenientes das casas construídas nas margens, somados aos despejos da pequena rede de drenagem pluvial, hoje toda a extensão da lagoa é imprópria para qualquer tipo de utilização. Implantação do Parque das Dunas e Lagoas de Abrantes, compreendendo as etapas de delimitação, plano de manejo, institucionalização mediante Lei Municipal, fiscalização do uso e ocupação do solo, (construção de escritório local e alocação de equipe técnica mínima).


Construção de muros de contensão às marés altas ao longo da praia, de tal forma a substituir a prática interminável e insustentável de despejar caçambas de pedras na areia, tentativa, quase em vão, de frear a invasão das águas em locais ocupados dentro da faixa de proteção do Patrimônio da União. Resolução definitiva e negociada sobre a permanência ou não das barracas de praia. Sucessivas Administrações Municipais têm patinado nesse quesito, sem avançar na solução ou apresentar qualquer proposta que seja a melhor para todos. Prolongamento viário da Avenida Beira Mar, até o limite do terreno da antiga Tibrás. Nessa intervenção, a Prefeitura terá que retomar a posse do antigo prédio do Camping, onde depois funcionou o Centro de Treinamento de Mão de Obra, operante até o ano de 2004.


A negociação passa pela área costeira pertencente à União. Num segundo momento, propõe-se a interligação desta nova via em frente à praia até a Estrada do Coco, ladeando o limite da propriedade da antiga Tibrás. Reforma ampla da Via Parque das Dunas, obedecendo ao projeto original discutido pela comunidade à época (idos de 2006/2008) e aprovado pelo CRA, atual INEMA.


Ainda na Via Parque das Dunas, construção de duas ruas coletoras transversais, a primeira ligando-a ao Loteamento São Francisco, obedecendo em parte o leito em terra batida já existente e a segunda a ser projetada ligando a Via Parque à micro localidade de Gajirus. Construção de via de ligação entre o antigo acesso ao Condomínio Albatroz e o Loteamento São Francisco, evitando a obrigatoriedade de percurso até a Praça da Igreja.


Construção do Terminal de Ônibus, em terreno amplo e ainda não edificado na Rua Direta de Jauá, cujo projeto já foi elaborado pela Sedur. Alargar o afunilamento existente entre o encontro da Rua Direta de Jauá com a Rua Aquarius, permitindo uma maior fluidez ao tráfego local. Implantação de sistema operacional de trânsito e tráfego em toda a região de influência de Vila de Abrantes.


Tais sugestões, que poderiam ter sido discutidas no início do atual governo, sem pressa e envolvendo parcelas da população impactadas pelos projetos, deveriam ter sido no mínimo consideradas como intervenções estruturantes do espaço urbano, viabilizadas através de convênios interinstitucionais ou parcerias público/ privadas, mesmo que, somente sob a forma de projetos executivos, serviriam como legado para as futuras administrações comprometidas com o ambiente e com as pessoas. De uma coisa estejamos certos: A pressa é inimiga da perfeição. Ou será a nova praça a vilã inimiga? Jauá, Camaçari, fevereiro de 2020.


Luiz Roberto Sobral  luizrobertosobral@gmail.com é  arquiteto urbanista, ex-secretário de Planejamento e Meio Ambiente da Prefeitura Municipal de Camaçari, morador de Jauá


Opiniões e conceitos expressos nos artigos são de responsabilidade do autor


 
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