Os responsáveis pela segurança do Palácio do Planalto nos atos de 8 de janeiro cometeram “graves omissões”. A avaliação é da Polícia Federal (PF) e constam no relatório final que apontou “falhas evidentes” da Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal (SSP-DF) na prevenção dos atos golpistas. Ainda segundo a PF, a análise de risco realizada pelo gabinete de Segurança Institucional (GSI) sobre os atos de 8 de janeiro foi classificada como nível “laranja”, o que subestimou a real ameaça representada pelos manifestantes que se deslocavam para Brasília naquele fim de semana.
Os investigadores confirmaram que general Gonçalves Dias, então chefe do GSI, recebia informes, desde o início de janeiro, do ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Saulo Moura, sobre o aumento do número de manifestantes e a possibilidade de ações violentas. No entanto, o general não compartilhou esses dados com a equipe de segurança do Planalto, nem adotou medidas proativas para reforçar a segurança nas primeiras horas de 8 de janeiro.
Para a PF, a retenção dos dados de inteligência da Abin foi “determinante para a falha na adaptação da resposta de segurança”, uma vez que as decisões estratégicas precisam ser ajustadas com base em uma avaliação precisa e atualizada do cenário, que serviria para atualizar o Plano Escudo — nome dado ao plano de segurança do Palácio do Planalto.
“A precariedade de informações sobre os eventos que aconteceriam em 8 de janeiro resultou em uma análise subdimensionada do risco, uma vez que a matriz de criticidade atribuída ao evento permaneceu no nível ‘laranja’, quando deveria ter sido ajustada para níveis mais altos à medida que os alertas se tornaram mais graves”, destaca o relatório da PF.
“Apesar de terem conhecimento da iminente ameaça desde as primeiras horas do dia 8, não foram tomadas medidas proativas para fortalecer as defesas. Mesmo com evidências de que mais de 100 ônibus já estavam presentes em Brasília e relatos de discursos inflamados entre os manifestantes, não foram coordenadas ações efetivas para prevenir a invasão ao Palácio do Planalto”, complementa o trecho do relatório.
A PF, que dividiu o relatório em quatro vertentes, apontou também que a falta de coordenação no fluxo de informações entre os órgãos envolvidos na segurança foi um fator crucial. Os investigadores ressaltaram que o GSI faz parte do Sistema Brasileiro de Inteligência (SISBIN) e, portanto, tinha a obrigação de “manter suas informações atualizadas e compartilhar os dados críticos com outros órgãos, como a Abin e as forças de segurança do Distrito Federal”. “As informações da Abin, que eram vitais para a prevenção da invasão, não chegaram ao conhecimento de todos os responsáveis pela execução das ações previstas no Plano Escudo”, observou a PF.
O GSI não participou da elaboração do Plano de Ação Integrada (PAI) no dia 6 de janeiro. Apesar dessa ausência, os investigadores concluíram que a interrupção do fluxo de informações de inteligência dentro da própria estrutura do gabinete foi a principal falha do órgão.
Para a PF, a matriz de criticidade utilizada pelo GSI para avaliar os níveis de ameaça é baseada em uma combinação de variáveis, como “número de manifestantes, sua beligerância e os riscos de depredação e invasão”. “Se a matriz de criticidade tivesse sido alterada para o grau ‘vermelho’, isso teria exigido a mobilização imediata de reforços, aumentando o contingente de segurança e colocando as forças de choque em posição mais estratégica para uma possível contenção dos manifestantes”, afirmou a PF no relatório.
“A decisão de manter a classificação de risco no nível ‘laranja’, mesmo diante de sinais claros de agravamento, foi um erro que teve consequências graves. As informações de inteligência, bem como as disponíveis em fontes abertas no dia 8 de janeiro, eram suficientemente claras para justificar uma mudança na postura defensiva”, acrescentou a corporação.
A PF também destacou que outros agentes-chave do GSI falharam em agir de maneira proativa diante das informações disponíveis no dia 8 de janeiro, como os generais Carlos José Russo Assumpção Penteado, ex-número 2 do GSI que supervisionava o Plano Escudo, e Carlos Feitosa Rodrigues, que ocupava a secretaria de segurança e coordenação presidencial do Planalto, além do coronel André Luiz Garcia Furtado.
“Os agentes mencionados no presente relatório, com responsabilidades operacionais diretas, falharam em agir de forma rápida e proativa diante de um quadro de deterioração evidente. A inação dos líderes dentro do GSI resultou em uma falha sistêmica que não apenas fragilizou a segurança do Palácio, mas também permitiu que manifestantes com claras intenções violentas superassem as defesas e realizassem um dos maiores ataques contra a democracia brasileira”, concluiu a corporação.
A PF concluiu que houve "falhas evidentes" por parte da Secretaria de Segurança do Distrito Federal (SSP-DF) — na época chefiada por Anderson Torres — na prevenção dos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023, que culminaram na invasão e depredação dos prédios do Congresso Nacional, Palácio do Planalto e Supremo Tribunal Federal (STF), no centro de Brasília.
O parecer faz parte de um pedido de manifestação enviado pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), à Procuradoria-Geral da República (PGR). No documento, Moraes solicita um parecer do procurador-geral, Paulo Gonet, e inclui trechos do relatório da PF que apontam falhas da SSP-DF no dia 8 de janeiro.
“Conclui-se que as falhas da Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal (SSP/DF) no enfrentamento das manifestações de 08/01/2023 são evidentes, especialmente pela ausência inesperada de seu principal líder, Anderson Gustavo Torres, em um momento de extrema relevância, aliado à falta de ações coordenadas e à difusão restrita de informações cruciais contidas no Relatório de Inteligência nº 6/2023, foram fatores decisivos que contribuíram diretamente para a ineficiência da resposta das forças de segurança”, cita o relatório.
O processo tramita no âmbito do inquérito 4.923, no STF. O relatório da PF também revela o despreparo da pasta no domingo dos atos golpistas, em 8 de janeiro. “Em suma, a ausência de articulação e de difusão de dados comprometeu a capacidade de antecipar e enfrentar os atos de violência, revelando um despreparo que não pôde conter a escalada dos eventos ocorridos em 08 de janeiro de 2023.”