Recorrentemente, nas propagandas, as gestões de municípios brasileiros celebram as dezenas ou centenas de vias asfaltadas. Em cada anúncio, os gestores se orgulham dos milhões e, até bilhões de reais, gastos em asfalto.
Quem disse que o asfalto é sempre a melhor solução para as cidades? Porque o asfalto virou plano de governo? Porque os jornais sempre divulgam que os deputados trocam apoio por emendas que concedem dinheiro público para compra de asfalto? Porque os prefeitos e vereadores acham que convencerão a população com tanto asfalto?
Não vou discutir o que pode estar por detrás destes acordos. O que me chama a atenção é que um quilômetro de asfalto custa em média R$ 1 milhão! É de assustar! Teoricamente, neste valor estão inclusos os custos de preparo do terreno, obras de drenagem, inserção de passeio público, meio-fio e mão de obra. Na prática, nem sempre se vê isso, mas sim obras mal executadas e asfalto de má qualidade.
Recentemente o atual prefeito de Camaçari comentou, em entrevista, que este ano sua gestão asfaltou mais de 100km de vias. Em outras palavras, gastamos mais de R$ 100 milhões em asfalto.
Muitos celebraram, mas você já imaginou o impacto desta verba em outros setores da sociedade? Não quero aqui dizer que obras de mobilidade não tenham importância. Sem vias trafegáveis não há um bom transporte, e sem deslocamento, há um prejuízo em cadeia para a cidade. Logo, as obras de pavimentação de vias têm sua devida importância.
A indignação que paira sobre dois públicos, é sobre o foco no asfalto. De um lado, a população em geral consegue sentir o calor que ele irradia, e também percebe, com frequência, a má qualidade da pavimentação aplicada nas ruas. Ademais, vê ainda, com revolta, as obras repetidas de recapeamento asfáltico numa mesma região. A mesma população, todavia, é refém das propagandas de que o asfalto é a melhor solução.
Do outro lado, especialistas no assunto explicam que nem sempre o asfalto é uma boa opção. O piso intertravado, semelhante aquele aplicado na nova via em São Cristóvão, Rio Vermelho e no Farol da Barra em Salvador, permite a infiltração da água da chuva, absorve menos calor, contribui com a iluminação à noite, possui alta resistência ao trânsito pesado, a longo prazo, custa bem menos que o asfalto, e pode ser uma alternativa em vários cenários. Além disso, o asfalto, apesar de mais flexível e de fácil execução, traz impermeabilização do solo, impedindo a recarga do lençol freático, e aumenta, consideravelmente, a temperatura do entorno.
Fiz questão de aferir a disparidade de temperatura na Rua 8 de Dezembro, no centro de Camaçari. Ao meio dia, a temperatura da calçada debaixo do sol estava em 38 graus Celsius e ao lado, no asfalto, a temperatura registrada foi de 52 graus Celsius. É este mesmo calor que irradia em toda a cidade com ruas asfaltadas.
Recentemente, em uma das oficinas de elaboração do Novo PDDU de Camaçari, uma engenheira ambiental comentou sua insatisfação com o asfaltamento de diversas ruas no bairro Camaçari de Dentro e Triângulo. A população podia não saber, mas eram ruas privilegiadas com piso intertravado, e agora se tornaram vias asfaltadas.
Não se divulga, mas Camaçari está sobre um dos maiores aquíferos da região Nordeste. Os lençóis freáticos também são generosos e superficiais. Todos eles sofrem com o excesso de pavimentação asfáltica. Se adotássemos, ao menos, nas vias locais, o piso intertravado, talvez todos sairiam ganhando, e, principalmente, o meio ambiente e os cofres públicos.
Juan Sterfan juan_sterfan@hotmail.com é camaçariense, advogado especialista em Direito Ambiental e Urbanístico, urbanista, arquiteto e membro da Comissão de Meio Ambiente, Mobilidade e Direito Urbanístico da OAB-Camaçari
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