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Waldeck Ornélas é especialista em planejamento urbano-regional

Nós temos os Zambiapungas


Povo eminentemente festeiro que somos, o Dia das Bruxas atrai, a cada ano, mais interesse no país, importando comemorações alheias. Um olhar para a cultura local pode, no entanto, sugerir oportunidade para a valorização de manifestações próprias. Sem xenofobia nem discriminação, é preciso preservar a cultura local e reservar espaço para comemorações genuínas, herdadas do nosso passado colonial.


Pois não é que, aqui mesmo na Bahia, é possível encontrar eventos de celebração à vida e de reverência aos mortos realizados na madrugada do primeiro de novembro, Dia de Todos os Santos, véspera do Dia de Finados?


Coube ao Instituto de Desenvolvimento Sustentável do Baixo Sul da Bahia (IDES), em plena pandemia, sob os auspícios da Lei Aldir Blanc, colocar em destaque a tradição dos Caretas e Zambiapungas do Baixo Sul baiano.


Presente nos municípios de Cairu, Nilo Peçanha, Taperoá e Valença, esta manifestação cultural é uma herança dos Bantos, os primeiros negros exportados em grande escala para a Bahia, ainda no remoto Século XVII.


Oriundo das práticas religiosas de matriz bantu (Congo-Angola), a apresentação dos bandos de Zambiapungas integra também as manifestações do catolicismo popular, e não sem razão participam das festas dos padroeiros locais e, muitas vezes, já foram aplaudidos em desfiles na capital do Estado, em eventos culturais.


Com suas roupas de seda e máscaras multicoloridas, movidos pela sonoridade de enxadas, búzios, caixas, tambores e cuícas, suas apresentações, de caráter lúdico e religioso, com coreografia dinâmica e vibrante, espantam os maus espíritos, atraem boas energias e reverenciam a ancestralidade, constituindo um alegre festejo.


Os grupos reúnem homens e mulheres, das atividades mais tradicionais – marisqueiras, pescadores e trabalhadores rurais. Em Valença, provêm do distrito de Maricoabo. Em Cairu, onde se diz terem nascido, estão presentes na sede municipal, na Velha Boipeba, na comunidade quilombola de Galeão e já não mais existem no Morro de São Paulo. Em Nilo Peçanha, é onde apresentam maior dinamismo e vitalidade. Em Taperoá, incorporaram dois personagens hilários, o diabo e o morcego. 


Romper a invisibilidade desta importante manifestação cultural constitui um dever a ser assumido pela política cultural da Bahia, valorizando mais uma de nossas tradições.  


No próprio Baixo Sul, a Fortaleza do Morro de São Paulo, um importante e imponente patrimônio arquitetônico-cultural, tombado pelo IPHAN, restaurado com apoio do BNDES, mas ainda sem uso, constitui um espaço que se oferece para apresentações regulares, capazes de atrair ainda mais turistas à Ilha de Tinharé, divulgando a cultura regional.


Os diversos grupos poderiam aí se revezar, nos finais de semana, gerar renda para a sua manutenção e sobrevivência, além de promover este importante bem cultural de natureza imaterial. A chegada do verão, alta estação turística, constitui momento apropriado para a implantação de um programa piloto, a ser consolidado.  


Reunir em um mesmo evento, a Fortaleza – um espaço qualificado e diferenciado – e os Zambiapungas – uma manifestação cultural genuína e singular –, agrega ao destino turístico, simultaneamente, um equipamento de cultural dedicado ao entretenimento e lazer, e uma apresentação cultural ímpar, soma um bem cultural material a outro, imaterial, diversifica a oferta local e rompe a monotonia e a exclusividade do turismo de sol e praia.


Não bastam apenas os atos de tombamento. A salvaguarda dos bens patrimoniais requer cada vez mais que se dê consequência prática e objetiva à sua percepção, exposição, uso e desfrute pela sociedade. Esse é um desafio que se impõe à modernização das políticas de proteção histórica, arquitetônica e cultural, requerendo uma nova atitude – proativa e dinâmica – por parte dos órgãos públicos incumbidos de sua guarda.


É preciso espantar os maus espíritos que perseguem os nossos bens culturais!


Waldeck Ornélas waldeck.vo@gmail.com é especialista em planejamento urbano-regional. Autor de “Cidades e Municípios: gestão e planejamento”. Foi senador, ministro da Previdência e secretário de planejamento do estado 


Opiniões e conceitos expressos nos artigos são de responsabilidade do autor

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