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O Sol a 2 de julho há de brilhar em Camaçari


Diego Copque é professor, historiador e pesquisador

“Nasce o Sol a 2 de julho                                  


Brilha mais que no primeiro


É sinal que neste dia


Até o Sol, até o Sol é brasileiro...”


Trecho da letra do Hino da Bahia de autoria de Ladislau dos Santos Titara, militar que participou das ações de combate da Independência da Bahia, testemunha ocular e cronista da guerra. Ladislau era natural de Capuame, hoje município de Dias D’Ávila. Naquela altura a povoação estava circunscrita no território da Vila da Nova Abrantes do Espírito Santo, hoje distrito da cidade de Camaçari. Há alguns anos defendo a tese da efetiva participação de Vila de Abrantes, das povoações de Camassary, Monte Gordo, Capuame e outras localidades ligadas à Vila de Abrantes nesse processo, e assim reivindicamos a inserção de Camaçari e D’Ávila no circuito das comemorações do 2 de julho.


A representação da figura do Caboclo e da Cabocla além da afirmação de uma ancestralidade ameríndia da “raça brasileira” também se deve à participação com bravura e heroísmos dos índios e seus descendentes na guerra da Independência. É assertivo afirmar que boa parte desses indígenas eram oriundos da Vila de Abrantes. Não podemos esquecer que a história de Camaçari é marcada pela fundação de quatro aldeamentos indígenas: os aldeamentos do Espírito Santo, (Vila de Abrantes); Santo Antônio de Rembé, (Arembepe); Santo Antônio da Barra do Rio Jacuípe, (Barra do Jacuípe); e Bom Jesus de Tatuapara, (Açu da Torre).


O Castelo Garcia D’Ávila sediado em Açu da Torre, entre 1822-1823 se tornou quartel-general das ações de combate contra os portugueses comandadas por Antônio Joaquim Pires de Carvalho e Albuquerque D’Ávila Pereira. Proprietário do Castelo Garcia D’Ávila, ele foi um dos responsáveis pela organização do exército libertador, com uma tropa formada de índios, caboclos, negros livres, pardos, cabras, mulatos, negros escravizados e voluntários brancos, que viviam na região do Litoral Norte. Seu batalhão passou a ser denominada de Companhia de Voluntários da Casa da Torre. Entre as ações de grande importância de Pires de Carvalho e Albuquerque, está o fechamento da Estrada das Boiadas, naquela época utilizada para o abastecimento da Cidade do Salvador, como registrado em um artigo anterior com o título de Camaçari no caminho do fogo simbólico e sua presença na Independência da Bahia.


A Estrada das Boiadas era uma trilha de terra que unia a cidade do Salvador a outras povoações, vilas, cidades e capitanias. Essa estrada, que corta Camaçari na região do bairro do Triângulo até o bairro de Santa Maria, conserva um trecho que servia para passagem do gado bovino criado nos sertões destinados à comercialização na Feira de Capuame, atual município de Dias D’ Ávila. Esse gado seguia para o abate no Matadouro do Barbalho na cidade do Salvador, dando origem ao nome da Estrada das Boiadas.


O trecho remanescente da Estrada das Boiadas, que passa pelo município de Camaçari, foi via de acesso das tropas baianas que, no dia 2 de julho após a fuga dos portugueses da Bahia seguiram com destino à cidade do Salvador. O exato trecho da estrada que nos referimos passa pelo atual município de Dias D’ Ávila seguindo pela via de ligação, passando pelo Complexo Petroquímico de Camaçari até o bairro da Lama Preta chegando até o bairro de Santa Maria e se estendendo ao distrito de Góes Calmon, que na época pertencia à Vila de Abrantes, sendo denominada de Moritiba do Rio Joanes, hoje pertencente ao município de Simões Filho. 


É importante ressaltar que nesse processo, o Engenho Novo Cotegipe, com sua localização estratégica foi de grande importância para a tropas baianas.  De propriedade de Luís da Costa Guimarães, sobrinho e único herdeiro do capitão João Francisco da Costa, o engenho foi utilizado como base para as tropas vindas de Santo Amaro.


João Francisco da Costa foi um dos maiores latifundiário dessa região, pois suas terras tinham início em Santo Antônio do Rio das Pedras, hoje bairro de Valéria na Cidade do Salvador, e se estendia até o Engenho Água Comprida na freguesia de São Miguel de Cotegipe (Simões Filho), onde era proprietário de três engenhos de cana-de-açúcar, seguindo até Catu de Abrantes. No território da Vila de Abrantes, próximo à povoação de Camassary, era proprietário do Engenho Olhos D’Água e de 11 fazendas. Entre as suas propriedades, destacamos as fazendas Buris, Camassary, Bandeira, Piranema, que também era denominada de Podres; Gravatá e Capuame. Todas essas fazendas estavam situadas nas margens da Estrada das Boiadas. 


Outra importante personalidade histórica que tem relação direta com a participação de Camaçari no processo da Independência foi Miguel Calmon du Pin e Almeida. Miguel Calmon nasceu em Santo Amaro da Purificação no dia 26 de outubro de 1794. Era graduado em bacharel em leis pela Universidade de Coimbra, em Portugal, em 1821. Regressou ao Brasil em 1822, quando atuou nos conflitos da Independência, e fez parte na Vila de Cachoeira da delegação composta por representantes das vilas de Abrantes, São Francisco do Conde e Santo Amaro da Purificação, que logo constituiu um Governo Provisório militar e civil com a participação de todas as vilas do Recôncavo baiano.  


Miguel Calmon juntamente com o tenente-coronel, Felisberto Gomes Caldeira, e o major de engenharia, Antônio Maria da Silva Teles, atuou como representante da Vila de Abrantes, que foi um dos primeiros palcos dos eventos relacionados à guerra da Independência e uma das primeiras bases de resistência até a instalação do Governo Provisório.


Miguel Calmon, como representante de Vila de Abrantes, presidiu o Conselho Interino do Governo da Bahia em 1823. Por sua atuação na guerra posteriormente foi nobilitado com os títulos de Visconde de Abrantes pelo Decreto de 18 de julho de 1841 e Marquês de Abrantes pelo Decreto de 2 de dezembro de 1854. Em reconhecimento por ter representado Vila de Abrantes no processo de Independência, hoje empresta seu título nobiliárquico de Marquês à Praça da Igreja Matriz da Vila de Abrantes, denominada de Praça Marquês de Abrantes.


Existem outras importantes referências a respeito da presença de Camaçari nesse processo, que a título de curiosidade podemos citar o reconhecimento da autoridade e regência de Dom Pedro de Alcântara como primeiro imperador do Brasil, fato que já havia ocorrido na Corte do Rio de Janeiro. A aclamação pelas autoridades da Vila de Abrantes ocorreu no dia 20 de fevereiro de 1823 no Paço do Conselho da Vila. Após aclamação foi realizada uma missa e foi cantado um Te Deum na Igreja do Espírito Santo da Vila de Abrantes pelo padre José Pereira da Fonseca.


Mais um importante fato que legitima o pleito da inserção de Camaçari no circuito do fogo simbólico, foi exposto no artigo que mencionei anteriormente, referente a edição do dia 16 de julho de 1930 do Jornal do Commercio do Rio de Janeiro. A publicação noticiou o reconhecimento do Estado da Bahia com relação à importância de Camaçari na Independência da Bahia. Naquela altura foi inaugurado pela diretoria do Arquivo do Museu Estadual da Bahia um marco comemorativo na cidade de Camaçari referente à sua presença e importância no processo que resultou na entrada dos batalhões patrióticos na Cidade do Salvador em 1823, passando todos os batalhões pela Estrada das Boiadas.


Acreditamos que essa seja, entre outras, uma das razões que justifica a inserção de Camaçari no circuito da passagem do fogo simbólico nas comemorações do 2 de julho. Esse primeiro reconhecimento histórico que data de 1930 não pode se perder no tempo. No ano de 2023, celebraremos os 200 anos da Independência da Bahia, e também os 100 anos da inauguração da primeira rodovia baiana denominada de Rodovia Bahia x Feira de Santana, que rebatizou a Estrada das Boiadas com o nome da rodovia. O trecho dessa autoestrada em Camaçari foi inaugurado no dia 5 de julho de 1923. Na perspectiva de que se faça “justiça histórica” com a inserção dos municípios de Camaçari e Dias D’ Ávila nas comemorações do 2 de julho, é que publicamos esse artigo.  Atualização 14/4/2021 às 17h50


Diego de Jesus Copque diegokopke@gmail.com é professor, historiador, pesquisador da História de Camaçari e autor do livro que está saindo do prelo Do Joanes ao Jacuípe, uma história de muitas querelas, tensões e disputas locais. 


Opiniões e conceitos expressos nos artigos são de responsabilidade do autor

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