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Documento mostra que a Vale sabia dos riscos das barragens

A Vale reconhece desde o começo do ano passado como um dos riscos de suas atividades a ocorrência de acidentes fatais com barragens. É o que mostra documento entregue à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) em janeiro do ano passado. O trecho faz parte dos fatores de risco citados pela mineradora em seu Formulário de Referência de 2018.


Especialistas dizem, no entanto, que as informações prestadas no documento são genéricas e provavelmente não servirão como argumento para que a empresa afirme que cumpriu com seus deveres de transparência diante dos investidores. As mesmas informações estão registradas na Securities and Exchange Commission, xerife do mercado nos Estados Unidos, onde a Vale também tem ações negociadas em Bolsa.


Nesta terça-feira, 12, uma segunda ação foi tornada pública contra a Vale na Justiça dos EUA. A ação questiona, além da Vale, o presidente da companhia, Fábio Schvartsman, e o diretor financeiro Luciano Siani Pires. O processo é movido pelo investidor Richard Epstein.


Após a tragédia de Brumadinho, a Vale já havia sido acionada na CVM e na Justiça americana. Nos Estados Unidos, as ações pedem ressarcimento dos prejuízos causados no mercado financeiro, em processos similares ao que resultou no pagamento pela Petrobrás de quase US$ 3 bilhões em 2018. As acusações têm em comum a alegação de que os riscos do negócio não foram devidamente informados pela mineradora, o que teria por consequência a manipulação das cotações dos papéis da companhia. A mineradora chegou a perder R$ 71 bilhões em valor de mercado no primeiro pregão depois do acidente.


“Esses relatórios entregues a órgãos reguladores servem para permitir o posicionamento dos investidores. Os fatores de risco lá colocados estão muito amplos e genéricos, com pouca ou nenhuma utilidade para eles”, avalia o professor da Coppead/UFRJ Celso Lemme. “Não permite a avaliação do possível impacto financeiro de cada um deles. Não é possível dizer se estou diante de um risco de R$ 1 mil ou R$ 1 bilhão, então como decidir quanto valem as ações da companhia?”, questiona.


Embora o formulário seja apenas um dos canais de comunicação da empresa com os investidores, afirma Lemme, a Vale deveria ter apontado mais detalhes sobre essas ameaças. “O texto poderia dizer que há análises genéricas, mas que no site haveria mais detalhamentos, mas não tem nada disso”, diz, ponderando que outras grandes empresas também deixam de ser específicas em seus formulários.


O relatório registrado na CVM é assinado por Fabio Schvartsman e afirma que “o setor de mineração está geralmente sujeito a riscos e perigos significativos”, incluindo entre eles “acidentes envolvendo barragens” que podem resultar em “doença ou morte de empregados, prestadores de serviços ou de membros da comunidade circunvizinha às operações”.


Esse formulário deve ser obrigatoriamente publicado por empresas abertas desde 2009. A Vale registrou pela primeira vez o risco de “morte de pessoas” no documento de 2012, mas sem mencionar acidentes com barragens. Apenas em 2016, após o acidente em Mariana (MG), que resultou na morte de 19 pessoas, a companhia passou a indicar a possibilidade de acidentes fatais envolvendo essas estruturas.


Para Fabiano Diefenthaeler, sócio do escritório N.Tomaz Braga & Schuch, as reivindicações dos acionistas também dependem das investigações, que devem esclarecer se a Vale tinha conhecimento de riscos específicos da barragem da mina do Córrego do Feijão, que se rompeu. “É uma obrigação de transparência descrever o risco inerente ao negócio que ela desenvolve. Mas se há um risco específico de uma determinada barragem romper, e, se ela identificou (esse risco), nessa hipótese a empresa deve ser responsabilizada por não ter comunicado isso”.


Na avaliação do advogado, os minoritários da mineradora podem ter direito de reaver prejuízos em razão da omissão da informação ou negligência da companhia em relação aos riscos. “É muito difícil que não haja alguma forma de responsabilização da empresa, não somente perante as vítimas da tragédia, o que é óbvio, mas perante os acionistas”, afirma, apontando que os processos nos Estados Unidos têm mais chances de vingarem do que no Brasil. “É uma questão de prática. Nos Estados Unidos você já tem a proteção de minoritários consolidada. Aqui isso ainda é um pouco turvo, temos pouca jurisprudência sobre o assunto”.


O sistema de processos coletivos é diferente nos dois países, lembra Magno Federici Gomes, professor de Direito na Escola Superior Dom Helder Câmara. “Nos Estados Unidos, há o class action, em que qualquer pessoa pode ajuizar a ação e o juiz vai verificar se aquela pessoa é uma boa representante daquela coletividade. Aqui somente o Ministério Público, os Estados, associações previamente constituída”, afirma Gomes, explicando que a CVM poderia apenas sancionar a mineradora, mas não tem poder para determinar a indenização pelos prejuízos em Bolsa.


Ele destaca que o sucesso de ações na Justiça para reaver prejuízos envolvendo empresas brasileiras é algo recente, que veio a partir das denúncias de corrupção da Petrobrás. “Os investidores têm direito às informações para fazer a gestão do seu investimento. Se elas não são fornecidas de maneira adequada, eles podem utilizar essa deficiência de informação como um fundamento para pedir o ressarcimento dos danos. Isso começou a acontecer com os balanços patrimoniais da Petrobrás”.


Confira abaixo trecho do formulário de 2018:


“As operações da companhia envolvem o uso, manuseio, armazenamento, descarga e descarte de substâncias perigosas no meio ambiente e o uso de recursos naturais. Com isso, o setor de mineração está geralmente sujeito a riscos e perigos significativos, incluindo incêndio, explosão, vazamento  de  gases  tóxicos,  derramamento  de  substâncias  poluentes  ou  outros  materiais perigosos, deslizamentos de rochas, acidentes envolvendo barragens, falha de outras estruturas operacionais e acidentes envolvendo veículos, maquinários e equipamentos móveis. Isso pode ocorrer por acidente ou pela violação de normas de operação e manutenção, podendo resultar em impactos ambientais e sociais significativos, danos ou destruição dos bens minerais ou das instalações de produção, ferimentos, doença ou morte de empregados, prestadores de serviços ou de membros da comunidade circunvizinha às operações, danos ao meio ambiente, atrasos na produção, prejuízos financeiros e possível responsabilidade civil. Além disso, em locais remotos, os empregados podem estar expostos a doenças tropicais e contagiosas capazes de afetar sua saúde e segurança. Não obstante as normas, políticas e controles da Companhia, suas operações permanecem sujeitas a incidentes ou acidentes, que podem afetar adversamente seus negócios, seus stakeholders ou sua reputação.” Jornal O Estado de São Paulo

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